Publicado em 18/02/2019 | Direito Civil, Direito do Consumidor, Podcasts, Passagens aereas

Indenização, voos atrasados, cancelados ou bagagem extraviada

A má prestação de serviços por parte das companhias aéreas é cada vez mais comum, principalmente na alta temporada, podendo-se citar como os problemas mais frequentes os atrasos e/ou cancelamentos de voos e o extravio de bagagem.

Por trás de um bilhete aéreo podem estar as mais diversas expectativas: a viagem de lua-de-mel, uma reunião de negócios, o regresso para casa ou as tão esperadas férias da família. Por isso, a ocorrência de atrasos ou cancelamento de voos e o extravio de bagagem podem causar danos materiais e morais de expressiva monta, transformando o sonho do consumidor em um verdadeiro pesadelo.

As companhias aéreas, na maior parte das vezes, quando diante de um problema, optam sempre pela solução que lhes é mais conveniente, deixando o interesse do consumidor em último plano. Na verdade, fazem um cálculo do custo/benefício, preferindo transferir ao consumidor o ônus advindo de sua falha, ao invés de ampará-lo.

No entanto, é preciso ficar claro ao consumidor que o mesmo está protegido, tanto pela legislação quanto pela jurisprudência dos nossos tribunais.

Conforme a regra do art. 14, do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade da fornecedora de serviços pelos danos causados aos seus clientes/passageiros é objetiva. Vale dizer: a empresa responde, independentemente da existência de culpa, por defeitos relativos à prestação do serviço, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição.

Já o art. 737, do Código Civil Brasileiro, estabelece que o transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena de responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior. Ainda no Código Civil, encontra-se plasmada no artigo 186 a regra no sentido de que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.“

Assim, no caso da prestação defeituosa do serviço, seja por atrasos/cancelamentos do voo e/ou por extravio de bagagem, deve a companhia aérea indenizar o consumidor pelos danos materiais e morais sofridos.

Os danos materiais são aqueles relativos a despesas com compra de roupas, alimentação, hotel, etc., eventualmente não suportados pela companhia aérea, que o consumidor foi obrigado a efetivar por conta da prestação defeituosa do serviço contratado.

Já os danos morais podem ser caracterizados por tudo aquilo que o consumidor sofreu em razão dos ilícitos praticados pela empresa aérea. No caso de cancelamento ou atraso de voo, por exemplo, o consumidor, além de toda a frustração e estresse gerados por esse tipo de incidente, pode ter perdido um compromisso no destino ou ter deixado de aproveitar um dia a mais de passeio, sem falar, muitas vezes, no drama de ficar desamparado em uma cidade estranha. Já nos casos de extravio de bagagem, é comum ficar sem roupas, sem material de higiene, passar frio e perder objetos de valor estimativo, como fotos, presentes, etc. Tudo isso causa angústia e sofrimento, razão pela qual cabível indenização.

A questão sobre a fixação do valor da indenização pelo dano moral, porém, é subjetiva, já que inexistem critérios legais rígidos para o arbitramento do montante. A doutrina e a jurisprudência têm construído paradigmas materiais, pautados pelo equilíbrio. Assim, é lugar comum o entendimento de que o valor da indenização deve representar para a vítima uma satisfação capaz de, senão compensar o mal sofrido, ao menos amenizá-lo, e para o ofensor uma pena, de caráter pedagógico, no sentido de inibir a reiteração de fatos similares no futuro. O montante indenizatório, por sua vez, não pode ser de tal forma elevado, que cause o enriquecimento do ofendido e o empobrecimento do ofensor, tampouco irrisório, a ponto de não reparar minimamente o dano sofrido e de não cumprir o efeito pedagógico ao ofensor, em face da sua insignificância.

Como antes dito, a jurisprudência é pacífica acerca do direito do consumidor à indenização pelos danos materiais e morais advindos da prestação defeituosa do serviço pela empresa aérea, como é exemplo, dentre tantas, a decisão abaixo:

"RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. COMPANHIA AÉREA. CONTRATO DE TRANSPORTE. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. ATRASO DE VOO. SUPERIOR A QUATRO HORAS. PASSAGEIRO DESAMPARADO. PERNOITE NO AEROPORTO. ABALO PSÍQUICO. CONFIGURAÇÃO. CAOS AÉREO. FORTUITO INTERNO. INDENIZAÇÃO DEVIDA.
1. (...).
2. O contrato de transporte consiste em obrigação de resultado, configurando o atraso manifesta prestação inadequada.
3. A postergação da viagem superior a quatro horas constitui falha no serviço de transporte aéreo contratado e gera o direito à devida assistência material e informacional ao consumidor lesado, independentemente da causa originária do atraso.
4. O dano moral decorrente de atraso de voo prescinde de prova e a responsabilidade de seu causador opera-se in re ipsa em virtude do desconforto, da aflição e dos transtornos suportados pelo passageiro.
5. Em virtude das especificidades fáticas da demanda, afigura-se razoável a fixação da verba indenizatória por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
6. Recurso especial provido."
(REsp nº 1.280.372-SP, 3ª Turma do E. STJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 7/10/2014, decisão unânime)

No mesmo sentido, vale citar trecho do voto da Ministra Maria Isabel Gallotti, quando do julgamento do AgRg no AREsp 156.386/RJ, 4ª Turma, ocorrido em 20/02/2014, DJe 13/03/2014. Confira-se (sem grifos no original):

"(...).
O fortuito interno, assim entendido como fato imprevisível e, por isso, inevitável, "não exclui a responsabilidade do fornecedor porque faz parte da sua atividade, ligando-se aos riscos do próprio empreendimento. Vale dizer, se o defeito ocorreu antes da introdução do produto no mercado de consumo ou durante a prestação do serviço, não importa saber o motivo que determinou o defeito, já que o fornecedor é sempre responsável por suas consequências, ainda que decorrentes de fato imprevisível e inevitável" (Fabrício Bolzan, Direito do Consumidor, Editora Saraiva, pág. 309 - grifou-se).
Aliás, na mesma linha, esta Corte já assentou que "na relação de consumo, existindo caso fortuito interno, ocorrido no momento da realização do serviço, como na hipótese em apreço, permanece a responsabilidade do fornecedor, pois, tendo o fato relação com os próprios riscos da atividade, não ocorre o rompimento do nexo causal" (REsp nº 762.075, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 29/6/2009)."

O consumidor, portanto, encontra amparo na lei e no Judiciário, quando lesado por uma companhia aérea, para buscar a reparação dos danos materiais e morais que sofreu. Por isso, é necessário que não abra mão desse direito, pois somente assim as empresas preferirão investir na qualidade da prestação do serviço ao invés de causar danos aos seus clientes.

(Artigo do colega e parceiro Júlio César de Azeredo SA OAB/RS 41.611)

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